Para uma criança de 10 anos, um filme de terror pode parecer ser
algo extremamente doentio e totalmente apavorante, embora algumas pessoas mais
velhas também achem o mesmo. Eu já estava acostumada com esses filmes e livros,
eram os meus favoritos, entretanto a mulher que me encarava com um olhos cinzas
e totalmente mortos me fazia tremer como nenhum filme ou situação teria feito
antes, senti um liquido quente descer por entre minhas calças, não havia
percebido que tamanho medo tinha me feito urinar. Olhei para baixo e vi que ela
havia retalhado o pescoço da mulher que estava ao lado de minha cabine, estava irrevogavelmente
morta.
-M-Moça, o
que v-você fez? – disse eu com tanto medo que as palavras embolavam em minha
garganta – Por que fez isso?
O ser agora
vinha em minha direção, fazia ruídos como se tivesse engasgada com alguma coisa
em sua goela. Eu não tinha reação, lágrimas começaram a descer de meu rosto e
buscava entender se ela iria fazer o mesmo comigo. Em meio à tanto desespero
voltei para dentro da cabine e ao fechar a porta percebi que a estranha mulher
erguia os braços como para um abraço mortal onde com certeza iria morder meu
pescoço ou qualquer outra parte de meu corpo pequeno e frágil.
Ao fechar a
porta com tamanha velocidade e medo, pude ouvir as batidas na porta onde o ser
empurrava para tentar me pegar, encostei minhas costas na porta gritei com uma
voz que até mesmo para meus ouvidos era ensurdecedora. Chorava com tanta força
que lágrimas escorriam fortemente de meu rosto. Meu Deus, o que poderia ser
aquilo?
- Mãe!!! –
Gritava com força para que minha mãe pudesse me ouvir, mas aquilo não iria adiantar
de nada, uma experiência bem traumatizante para uma criança de 10 anos.
As batidas
pararam e no mesmo momento um braço ensanguentado passara por baixo da porta
agarrando meu tornozelo e puxando, a mulher tinha tamanha força que eu poderia
até mesmo desconfiar se realmente era um ser humano. Meus batimentos cardíacos
ficaram extremamente fortes, o medo que antes sentia virava agora um desespero
que me fazia tremer dos pés à cabeça. Foi então que com um grunhido e com um
puxão caí com o tórax no vaso sanitário, o ser ainda segurava meu tornozelo e
pude ver que seus olhos mortos me olhavam por baixo da porta.
A cabeça da
mulher começava a forçar seu corpo para entrar, eu gritava muito e sentia minha
garganta doer de tanto esforço vocal. Muitos podem me achar uma medrosa por não
reagir contra uma criatura asquerosa daquelas, mas devo lembrar que além de ter
10 anos, isso não é um filme onde com superpoderes poderia liquida-la, na vida
real, as são pessoas normais e tem medo como qualquer outra.
- Aaaarrgh –
grunhiu a mulher que agora passara um pouco de seu tronco pela frecha debaixo
da porta.
- Não –
gritava eu respirando desesperadamente – Por favor me solte, eu não fiz nada
pra senhora. – mesmo o ser querendo me fazer mal, ainda era um criança com educação
e não conseguia tratar mal pessoas mais velhas.
Não tinha
jeito, a criatura gritava agora fazendo mais força para aproximar meu tornozelo
de sua boca rasgada que sujava toda a cabine incluindo meu tornozelo. Em um
pequeno momento de bravura aproveitando a força que ela fazia ao puxar minha
perna, resolvi chutar sua cabeça com a planta do pé. Havia sido certeiro pois
arrancara dentes de sua boca que agora sangrava ainda mais. Entretanto, ela não
desistia, gritava e puxava ainda mais minha perna, resolvi então chutar mais
uma vez, e repetidas vezes até ela soltar, mas não largava.
Sua face já
estava deformada após tantos chutes, eu arfava tentando puxar cada vez mais ar
para próximos golpes. A perna começava a doer pois mesmo após tantos dentes
perdidos, nariz entortado violentamente e olhos inchados o ser parecia não ter alterado
sua grande vontade de me matar. Foi então que segurei o choro, e empurrei as
duas pernas com tamanha força desconhecida por mim até agora, na face da
criatura fazendo sua cabeça enganchar na porta, mais uma e duas vezes até ouvir
um crack e então parou de se mover e
afrouxou suas mãos descansando a cabeça sobre o chão onde não se levantou mais.
Estava sem ar, inspirava pela boca como se não respirasse á anos, os olhos
estavam extremamente arregalados e surpresos, como se tudo o que havia lido em
livros de terror tivesse saído para me conhecer. Voltei meu corpo para o lado
do vaso sanitário e então, sem força alguma para levantar, desmaiei. Não sei
por quanto tempo dormi, mas foi tempo bastante para sonhar. Conseguia relembrar
o olhar de minha mãe ao me acordar naquela manhã e o rosto feliz de papai ao me
abraçar com afeição. Mas aquilo era apenas um sonho de algo já havia
acontecido.
Ao acordar,
olhei para as lâmpadas que estavam piscando frequentemente, aos meus pés, estava
ainda a mulher que permanecia na mesma posição onde lembrava antes de dormir,
com a cabeça e o braço direito totalmente ensanguentados dentro da cabine.
Seria impossível abrir a porta daquele jeito, ainda estava confusa do motivo
que aquela mulher veio para cima de mim, na verdade, eu nunca tinha a visto em
lugar algum de Paraíso, não tinha motivos para me fazer mal ou me matar como
pensara.
Subi em cima
da caixa atrás do vaso sanitário, fiz um esforço para segurar nas bases da
cabine sanitária e pulei para fora caindo com um joelho no chão, o que me fez
gritar com veemência. Pude ver o corpo ainda da mulher estirado no chão com seu
pescoço aberto que mergulhava o chão em um carmesim forte e nojento para mim. Olhei
para trás para ver uma última vez o corpo do ser com a cabeça dentro da cabine,
aquilo me fez arrepiar.
Me levantei
e caminhei com dificuldade até a porta do banheiro feminino que estava aberta,
o que era raro em shoppings. Meu joelho e tornozelo ardiam fortemente, mas
precisava sair dali, queria encontrar minha mãe. No final dos corredores onde
levavam ao banheiro tive uma visão apocalítica do shopping onde até antes de
minha fatídica “aventura sanitária” estava normal e cheio de pessoas, aquilo
realmente estava infernal.
Observei
pessoas mortas em toda a parte, lojas pegando fogo, gritos de pessoas em alguns
lugares distantes, coisas quebradas, vidros espalhados por toda parte. O que
estava acontecendo ali? Onde estaria minha mãe? Se naquele tempo eu tivesse a
cabeça madura que hoje tenho, não teria feito o que relatarei agora. Saí
correndo gritando “mãe” e “socorro”, passei por lojas e escadas e só o que via
eram pessoas mortas, partes anatômicas arrancadas e sangue, muito sangue
jorrando por todos os lados. Ao chegar na praça de alimentação vi um aglomerado
de pessoas de costas e para minha loucura juvenil, gritei.
- Hei vocês!
– minha voz ecoou naquele lugar silencioso – Vocês viram minha mãe? Me ajudem
por favor! – que loucura eu havia feito.
Quando
viraram para me olhar, tudo o que vi foram mais seres iguais aquela mulher no
banheiro. Alguns sem braços, outros com o cérebro para fora de suas cabeças
fazias, aquelas diabruras estavam em um banquete infernal onde comiam outros
seres humanos. Produziam o mesmo som, um grunhido forte como um pigarro na
garganta, alguns grossos outros finos. Estavam vindo em minha direção, comecei
a gritar e saí em desespero para a escada lateral.
Quando
comecei a descer, lá estava ela deitada no chão. Seu braço estava quase caindo,
estava sem uma perna mas me olhava atentamente com olhos mortos. A parte
inferior da boca estava totalmente comida, onde o que se mostrava era uma
mandíbula aberta faltando dentes. Eu não conseguia acreditar no que via, estava
paralisada e novamente lágrimas desciam do meu rosto, a única palavra que
consegui expressar em meio à tanta dor era...
- Mãe?
AUTORIA: Celso Machado.
AUTORIA: Celso Machado.